São pequenos, por vezes, muito pequenos: são os bebés prematuros. Nasceram “antes de tempo” (alguns às 23-24 semanas) e por isso, um longo caminho têm que percorrer, desde que entram na Unidade de Neonatologia até ao dia da sua alta.
Caminho longo, cheio de “atalhos” e de incertezas, que fazem deste percurso, um percurso sempre cheio de surpresas, nem sempre desejadas, nem sempre com um final feliz!
Frágeis e indefesos, dependentes da tecnologia que lhes permite sobreviver, mesmo assim, necessitam de todo o calor humano que cada gesto transmite. E cuidar deles, mais do que uma função, é antes de tudo um desafio às capacidades humanas que cada profissional coloca no seu cuidado e ao trabalho de uma vasta equipa.
Os enfermeiros, que o acolhem na Unidade após o nascimento, tudo prepararam para o receber: a incubadora “quentinha”, os monitores para vigiarem as suas funções vitais, o ventilador e tanto mais…
Ele (o bebé) chega e o centro da nossa atenção e cuidado é aquele bebé, sempre diferente de qualquer outro, de muitos outros que por ali passaram, único nos sonhos e fantasias dos seus Pais! Os primeiros momentos são de grande tensão, pois nunca estamos completamente preparados para as situações e sabemos quão importantes são estes primeiros momentos, estes primeiros gestos!
Muitas vezes, são os pais os primeiros que têm contacto com o bebé, e chegam à Unidade, expectantes, angustiados e sedentos de informação sobre a situação do seu filho.
Habitualmente, um enfermeiro tem o primeiro contacto com o pai: explica-lhe sumariamente a situação do bebé, preparando-o também para o ambiente que o rodeia (os tubos, os fios, que ligam o bebé, os aparelhos que o rodeiam). Depois, acompanha-o até ao bebé. Apoia-o no primeiro “embate”. Dá-lhe tempo… ouve as suas dúvidas, os seus temores… responde com prudência (entre a realidade de uma situação grave e a esperança de que vai melhorar) e de uma forma calorosa. Se o pai desejar, leva uma fotografia do seu bebé
para que a mãe o possa ver, ainda antes de vir à Unidade.
Cada dia é um dia, e assim vão acontecendo muitos dias! Ali estamos diariamente, cuidando daquele bebé, tão frágil, sensibilizados para as suas necessidades e para os seus problemas. Todos, procuramos ainda minimizar o impacto do ambiente e dos cuidados que proporcionamos ao bebé: ainda que saibamos que os cuidados intensivos são fundamentais à sua sobrevivência, sabemos também que os custos para o seu desenvolvimento, são por vezes, elevados (o ruído, a luminosidade, a manipulação, os procedimentos dolorosos…). Tão importante como ajudar o bebé a sobreviver, é fundamental que o ajudemos a sobreviver sem sequelas ou
com sequelas mínimas. As expectativas dos Pais são essas!
Também a relação dos Pais com o seu bebé, é desde o primeiro momento incentivada, de acordo com os desejos dos Pais, pois importa compreender que para estes, esta é uma etapa das suas vidas, vivida muitas vezes, com sentimentos de culpa, de sonhos “falhados”, de impotência, de frustração, de medos e dificuldades… Nem sempre, é fácil aos Pais num primeiro momento, olhar para o seu bebé, tocá-lo e senti-lo como seu!
Estar disponível, saber ouvir, compreender os seus medos e dificuldades, a agressividade por vezes latente nas suas palavras e comportamentos, é também parte do desafio de cuidar destes pequenos bebés, pois estes não existem sem os seus Pais, nem cuidamos deles, sem cuidar também dos seus Pais, apoiando-os nos momentos difíceis e partilhando com eles as vitórias do dia-a-dia.
Ajudar os Pais a cuidar do seu bebé, procurando autonomizá-los e preparando-os para o levarem para casa, é um dos aspectos fundamentais que os enfermeiros e toda a Equipa privilegiam, atendendo a uma filosofia de cuidados centrada na família.
Para os Pais, confortar o seu bebé, pô-lo ao colo, mudar a sua fralda, dar-lhe o primeiro banho ou o biberão, são decerto grandes “etapas” para quem vive no dia-a-dia a incerteza do dia seguinte.
Depois quando vão para casa, outra etapa se abre, fundamental na consolidação de uma família que se autonomiza, mesmo que os “laços” perdurem ainda por alguns anos: os telefonemas para resolver algum problema ou dúvida, as consultas de Neonatologia, as visitas à Unidade, as fotografias que nos deixam e que ilustram as Histórias de cada um e o privilégio que tivemos em partilhá-las!
5 comentários:
Por momentos revivi parte dos longos "dia-a-dias" que vivi na unidade.
Revi-me e arrepiei-me à medida que ia lendo o texto, não fosse essa a história mais importante da nossa vida. Os bons e os maus momentos estão lá (quase) todos e fazem parte da longa caminhada pela qual, quer os pais quer toda a equipa técnica têm de passar. Doi a todos, não fosse o empenho e a entrega total!
Muito obrigado.
quando li a tua postagem recordei...velhos tempos...em que no inicio da minha carreira passei por experiencias semelhantes...como mãe e como profissional tenho por vós...tias e tios uma grande admiração e carinho...
quando por aí passo fico encantada ...com a vossa dedicação para com esses pequenos seres que todos os dias voces fazem renascer.... o meu carinho e amizade para voces e a promessa que por aqui passarei sempre para vos ler comentar.. beijo grande
Enfª Graça
Estive hesitante em ler V. artigo.
Sabia que caso o fizesse iria relembrar sentimentos, que ainda hoje não consigo explicar.
Resolvi ler, e em boa hora o fiz, os sentimentos, esses estavam lá todos. Não consegui, como previa, suster algumas lágrimas, que agora posso dizer que são de agradecimento, e felicidade. OBRIGADO. Pai do Duarte (Mendes)21.07.2004.26 semanas-860 grs
A passagem pela Unidade mudou para sempre o modo como vivo a vida e o texto da Srª. Enfª. Graça diz porque é que isso aconteceu sem que alguma vez ela tivesse falado comigo sobre o assunto.
A virtude do texto está na capacidade de nele se expressarem sentimentos muito fortes que são vividos por nós pais quando ali temos os nossos filhotes dentro daquelas caminhas de vidro tão quentinhas.
Vivi 40 dias extraordinários num sítio onde, mais do que tudo, se respira vida ... muitas vezes luta por ela.
Diria que o nosso sofrimento resulta da incapacidade de reagirmos à fragilidade que, nos primeiros dias, toma conta de nós, quase que comunicada pela fragilidade dos corpos tão pequeninos dos nossos filhos.
Depois, todas aquelas pessoas que ali nos ajudam a cuidar dos nossos pequenotes ( desde a zelosa auxiliar, passando pelas enfermeiras e enfermeiros de todas as horas e para todos os mimos e cuidados até aos médicos e médicas que mostram uma quase devoção pelos seus bébés )fazem com que voltemos a ser novamente fortes. Nessa altura, só sobra tempo para os mimos e para nos deleitarmos com aqueles olhinhos que nos observam e tudo parecem esperar de nós.
Os meus filhos também sofreram alguns pequenos sobressaltos durante o tempo que estiveram na Unidade e, como todos os outros pais, vivi-os com preocupação ... mas, não tenho nenhuma dúvida, aqueles 40 dias foram os mais felizes da minha vida.
Durante esse tempo conheci os meus filhos, desejados durante tanto tempo, eles conheceram-me a mim e ao pai e nesta comunhão estivemos sempre rodeados de pessoas absolutamente extraordinárias a que estaremos gratos para o resto da vida por tudo o que desinteressadamente fizeram pela minha Família.
Mãe dos bébes ( 3 ) Silva. Junho/Julho.2004
Com um enorme nó na garganta, gostaria de dizer que este post está....EXTRAORDINÁRIO! A sua leitura me transportou para tempos vividos com grande angústia, mas com muita esperança, esperança essa que presentemente tento transmitir a outros pais que enfrentam a prematuridade dos seus filhos. Obrigada pelo vosso empenho, profissionalismo e dedicação que tanto ajuda estes "apressadinhos".
Para mim, vocês, serão sempre apelidados de "fantásticos". Gostaria muito de ter a vossa visita em www.nascerprematuro.org
Bem hajam.
Ana
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